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Elas são mães solo por opção: ‘Não necessitam de um modelo tradicional de família para realizar sonho da maternidade’

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Bettina Boklis não via como poderia formar uma família que sonhava nos moldes tradicionais. A diretora de marketing decidiu seguir por uma vida alternativa e fez a fertilização in vitro aos 41 anos para se tornar mãe, mesmo sem um parceiro. Assim como ela, Gabi Oliveira, do canal DePretas, trilhou o mesmo caminho, porém por meio da adoção: ‘As mulheres estão enxergando na maternidade uma forma independente de realizar seu desejo de ser mãe’

 

 

Prestes a completar 40 anos, Bettina Boklis se viu longe de formar uma família do jeito que sonhava, nos moldes tradicionais da sociedade. Sem parceiro ou qualquer expectativa de encontrar alguém para seguir com esse plano, a diretora de marketing resolveu seguir por um caminho diferente: o da maternidade solo por opção.

“Você vai crescendo profissionalmente, sendo promovida e tendo aquela independência financeira. Começa a conquistar as suas coisas e talvez tenha dificuldade de arranjar alguém legal para namorar por conta do foco na carreira”, reflete ela em entrevista para Marie Claire.

Para a carioca, a situação não era diferente: por conta da carreira, focou no lado profissional – ela tem um currículo extenso passando por multinacionais. Depois de uns anos, se viu em uma idade em que queria se preparar para ser mãe. “Eu queria ter uma maternidade tradicional, mas com quase 40 anos, pensei: ‘O que eu faço na minha vida?’.”

“Primeiro, tive que digerir que era preciso partir para uma outra opção, porque casar e ter filho matematicamente, pra mim, não dava. Até conhecer alguém, passar pelo menos dois Réveillon com um cara, casar e decidir ter filhos, podia demorar e eu não tinha tempo”.

Foi então que Bettina resolveu pesquisar quais outras possibilidades teria dentro do seu sonho de gerar uma criança e, achou a solução por meio de um livro que abordava justamente a maternidade independente. “Há 11 anos não se falava tanto sobre isso. Perguntei ao meu médico os próximos passos e fui encaminhada para um especialista em reprodução assistida. Aí eu comecei a embarcar nessa história”.

Ela escolheu fazer a fertilização in vitro (FIV): a técnica tem como objetivo coletar óvulos diretamente dos ovários de uma mulher e fertilizá-los com sêmen em laboratório. Todo o processo durou um ano, desde o congelamento de óvulos, aos 41 anos, até realmente engravidar. “Simplesmente embarquei nessa jornada, só que não contei para quase ninguém, apenas para uma amiga. Foi uma experiência muito introspectiva”.

A discrição aconteceu principalmente porque “fazer uma FIV não é sinal de que vai engravidar”. “Eu passei por uma [tentativa] aí deu aquela ansiedade por não ter conseguido. Passei por outra e na terceira é que eu engravidei”.

Bettina dá mentoria para mulheres que também querem seguir o caminho da maternidade independente — Foto: Arquivo Pessoal

O procedimento, no entanto, é inacessível à maioria das brasileiras. Uma única tentativa, e considerando apenas a primeira fase, que inclui uma bateria de hormônios e o congelamento em si, custa em média R$ 18 mil. Ainda assim, nos últimos dez anos, o número de embriões congelados cresceu 225% – foram 114 mil embriões só em 2021, segundo relatório de 2020 publicado pelo Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio), coletados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e analisados pela Associação Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA).

Priscila Sanches, psicóloga clínica especialista em gênero, também elabora que além do aspecto financeiro, é essencial pensar na rede de apoio ao planejar a família. “Não é porque não haverá um pai no sentido tradicional que não deva existir uma rede de apoio”.

“Essa rede é crucial para que a mãe não se anule ao longo do processo. Ela é mãe, mas também trabalha; é mãe, mas também merece lazer; é mãe, mas não é apenas mãe. Portanto, é crucial uma rede de apoio que facilite a vida dela e da criança ao longo dos anos”

Outra via para a maternidade solo é a adoção: foi a escolha da influenciadora Gabi Oliveira, do canal DePretas. Com o sonho de ser mãe aos 30, ela deu entrada no processo de adoção aos 28 depois de terminar um relacionamento. Foram quase dois anos até Mário e Clara se tornarem oficialmente seus filhos. Toda a jornada, inclusive, foi documentada em suas redes sociais.

“Tem muitas coisas que são nebulosas às pessoas e foi isso que me impulsionou também a produzir conteúdo na internet. Quis mostrar que não era tão complexo”, disse, em evento promovido por Ecoa.

Quando recebeu a ligação que tanto esperava, depois de passar por todo o processo exigido pela Vara da Infância e Juventude, Gabi viu tudo mudar. “Eu era uma mulher solteira e, de repente, minha vida virou em uma noite”, compartilhou ao Mina Bem-Estar.

A influenciadora ainda mudou de cidade: saiu de São Paulo e foi para Niterói, no Rio de Janeiro, onde mora sua família. Essa rede de apoio “fez toda a diferença” e, atualmente, consegue sair e aproveitar os amigos: “A vida vai se encaixando.”

Gabi Oliveira passou por um processo de 2 anos até oficializar a adoção — Foto: Reprodução/ Instagram
Gabi Oliveira passou por um processo de 2 anos até oficializar a adoção — Foto: Reprodução/ Instagram

“Forma independente de realizar seu desejo de ser mãe”

Cada família possui suas particularidades: a maternidade solo por opção é uma formação familiar assim como outras. “As mulheres estão enxergando na maternidade uma forma independente de realizar seu desejo de ser mãe, sem depender de um parceiro. Com a crescente dificuldade de encontrar um parceiro recíproco e estabelecer um relacionamento saudável, elas estão percebendo que não necessitam de um modelo tradicional de família para satisfazer seu desejo pela maternidade. Esses dois aspectos não precisam estar necessariamente correlacionados”, analisa a psicóloga clínica Priscila Sanches.

A especialista vê a terapia como uma importante aliada no geral, incluindo para as mães solo. “Não apenas para aquelas que optaram conscientemente por essa jornada, mas também para quem se encontra nessa situação devido ao abandono ou à falta de participação do parceiro na parentalidade. Para as mulheres que escolhem ser mães solo, a terapia desempenha um papel crucial ao ajudá-las a se prepararem para as responsabilidades envolvidas”.

“É essencial discutir durante as sessões a construção ou existência de uma rede de apoio, proporcionando-lhes a capacidade de enfrentar os desafios e resistir ao preconceito que infelizmente muitas vezes enfrentam”.

Ela também comenta sobre muitas mães solo serem alvo de preconceito, especialmente dentro de uma estrutura patriarcal e machista. “Elas são frequentemente vistas como ‘fracassadas’ por não se encaixarem no modelo tradicional de família, onde o sucesso é definido pela conformidade com padrões de casamento e filhos. Essa visão estigmatizante precisa ser discutida e confrontada durante o processo terapêutico, dando às mães solo a força e a confiança necessárias para desafiar esses estereótipos e viver de acordo com suas próprias escolhas e valores”.

Os tabus da maternidade independente

Bettina Boklis chama atenção para o estigma de “fracasso” que muitas mães carregam erroneamente. “Esse é um dos grandes medos e tabus da maternidade independente. Porque está criando uma criança sem pai ou que não casou. Como se fosse uma falha. Mas não é.”

Com a experiência adquirida ao ser mãe da Catharina, a carioca resolveu ajudar outras mulheres a destravarem os seus medos para uma maternidade sem parceiros por meio de uma mentoria. “Uma das coisas que elas mais me perguntam é se não é egoísmo criar um filho sem a presença de um pai. Eu sempre falo que a conexão que você cria é tão grande que essa criança nem alcança um dia de te cobrar egoísmo, nem nada disso”, declara.

“Egoísmo é muito fruto de preconceito da sociedade. A criança tem só você como referência e ela acredita que é você que faz tudo pra ela. Eu tenho uma função de mãe reforçada. Não sou um pai e uma mãe”, finaliza.

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