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Maioria de casos se resolve em 2 dias, mas há quem esteja desaparecido há 4 anos

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“Todo desaparecimento é potencialmente um crime grave”, diz delegado Carlos Delano

 

A maioria dos desaparecimentos se esclarece em dois dias, logicamente as piores 48 horas na vida de qualquer família, mas há sumiço que se arrasta por 1.693 dias. Caso de uma jovem de 22 anos, que desapareceu em Campo Grande em 2018 e, desde as 9h52 daquele dia, não deixou nenhum vestígio.

“Felizmente, mais de 90% dos registros de desaparecimento se resolvem nos primeiros dois dias. Porque a pessoa retorna. Mas é necessário registrar porque todo desaparecimento é potencialmente um crime grave”, afirma o titular da DHPP (Delegacia Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa), Carlos Delano.

Na semana passada, a notícia de quatro corpos carbonizados, dois na Capital e dois em Três Lagoas, mobilizou as dores de muitas famílias com parentes desaparecidos, que buscaram o Campo Grande News com pedido de informações. Movimento similar acontece na delegacia, com pessoas à procura de seus entes queridos, mesmo diante de um cenário triste.

De janeiro a julho de 2023, os dados mostram 334 pessoas desaparecidas em Campo Grande. Sendo 227 homens e 107 mulheres. Do total, 37% têm faixa etária de 35 a 59 anos (124 pessoas). Outros 56 são adolescentes, enquanto 52 têm de 18 a 24 anos, faixa etária de quem ingressa na vida adulta.

“Uma pessoa adulta, que já tem vínculos bastante estáveis, e que por um motivo ou outro, decorrentes de frustrações profissionais, conflitos familiares ou pessoais se furtam do contato, da convivência, por um ou dois dias, e há registro de ocorrência em virtude disso. O desaparecimento pode acarretar risco à segurança daquela pessoa, provocado por terceiros ou por ela mesma. Há casos em que esse desaparecimento desaguou num suicídio. Se tivéssemos encontrado antes, quem sabe poderia ter sido evitado. Também não é só um problema de segurança pública, mas de saúde mental. E nos socorremos de estabelecimentos de saúde e assistência social neste trabalho de busca aos desaparecidos”, diz Delano.

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Contra a crença popular de que é preciso aguardar 24 horas para registrar Boletim de Ocorrência na Polícia Civil, o titular da Delegacia Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa reforça que não há tempo mínimo e a importância de a segurança pública ser comunicada.

“A gente sempre repete, não há tempo. As 24 horas são um mito. Nenhuma delegacia pode deixar de registrar. Vou dar um exemplo. Um adolescente de 12 anos que sai da escola às 11h30 e chega em casa às 12h15. Se às 14 horas ainda não chegou, a mãe refez o caminho, falou com as pessoas que estão frequentemente com ele, mas ninguém sabe, ninguém viu, o que impede o registro? Absolutamente nada. Ao proceder o registro, todo o sistema de segurança tem conhecimento do desaparecimento dessa pessoa. Ao fornecer uma fotografia, ela está no sistema da polícia e é um instrumento de grande relevância na busca pela pessoa, que pode estar em risco”, enfatiza o delegado.

Nos casos sem esclarecimento, o inquérito policial, acompanhado por Ministério Público e Poder Judiciário, é arquivado. Contudo, pode ser retomada caso surjam novos elementos de convicção.

“Isso não significa desistir. Mas a investigação não pode ficar eternamente aberta no sistema, segundo a lei brasileira. Trabalhamos com casos que têm dois, três anos. O caso da Regiane Alves Medeiro Acunha é um caso emblemático”, diz o delegado.

Sem vestígios – Regiane desapareceu em 13 de dezembro de 2018, portanto há quatro anos e 232 dias. Naquela data, tinha 22 anos e saiu de casa para fazer acerto trabalhista.

Regiane sumiu em 2018. (Foto: Reprodução)
Regiane sumiu em 2018. (Foto: Reprodução)

Ela foi vista pela última vez no ponto de ônibus da Rua Diogo Álvares, no Jardim Tijuca. A atendente de telemarketing foi deixada no local por parente, por volta das 8h, e tinha como destino o sindicato da categoria, onde iria receber o dinheiro referente ao acerto de rescisão do contrato de trabalho.

Por WhatsApp, a última conversa conhecida foi às 9h52 daquele dia. Quando disse: “tá, depois nós se fala” em diálogo com o pai de seus filhos.

A investigação cumpriu mandado de busca em residência, obteve ordem judicial para quebra de sigilo de dados de celulares, consultou banco de dados de aplicativos de transportes e teve acesso até aos prontuários de atendimento de Regiane na rede pública de Saúde.  A reportagem não conseguiu contato com a família nesta quarta-feira (dia 2).

Banco de DNA – Em 25 de maio de 2021, familiares de Regiane coletaram material para fazer parte de banco genético nacional, criado para tentar ajudar na localização de desaparecidos.

O método prevê cruzamento de dados de pessoas vivas com o DNA das desaparecidas. Se algum “bater”, a família que procura a pessoa será avisada. Somente parentes em primeiro grau podem doar materiais.

Conforme o delegado Carlos Delano, toda vez que há uma pessoa desaparecida, os familiares que têm vinculo genético são chamados e é coletada amostra de DNA, posteriormente remetida para o Ministério da Justiça. O trabalho é por meio de parceria com o Instituto de Análises Laboratoriais Forenses, da Secretaria de Justiça e Segurança Pública.

Material genético coletado de familiares vai para banco de dados nacional. (Foto: Edemir Rodrigues/Sejusp)
Material genético coletado de familiares vai para banco de dados nacional.

Em Mato Grosso do Sul, ainda não houve reconhecimento com base no banco genético. Em âmbito nacional, o delegado relata um caso de impressionar.

Em 2011, um pescador desapareceu no Ceará, após sair de casa para trabalhar. Em 2015, um corpo foi encontrado no litoral de Santa Catarina, a mais de 3 mil quilômetros de distância. No ano de 2020, análise do Banco Nacional de Perfis Genéticos identificou que o morto era o pescador sumido há uma década.

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