logo-kanal

Juiz que invalidou multas de trânsito na Capital manda investigar a Agetran

Compartilhar

 

Decisão que paralisou radares também trouxe ponto que afeta gestão de autarquia, em ação civil pública movida por ex-prefeito

 

Na mesma decisão que determinou a suspensão de aplicação e pagamento das multas nos últimos 12 meses em Campo Grande, magistrado também afirmou que a atuação da Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran) em manter o Consórcio Cidade Morena, que era o responsável pelos radares, deve ser alvo de investigação.

No dia 5 deste mês, o juiz Flávio Renato Almeida Reyes assinou uma decisão que suspende o pagamento de multas aplicadas nos últimos 12 meses em Campo Grande, a partir de quando o contrato entre o Consórcio Cidade Morena, responsável pelos antigos radares, e o executivo municipal se encerrou, em setembro de 2024.

A ação atende o pedido de tutela antecipada movida pelo ex-prefeito e agora vereador de Campo Grande, Marquinhos Trad (PDT).

Porém, outros trechos e afirmações do juiz chamam a atenção. Já na conclusão sobre a ação civil pública do ex-chefe do executivo municipal, Almeida afirma que, também, deve-se analisar os atos da Agetran.

“No fim, a análise se dará sobre a validade dos atos de polícia praticados pela Agetran (não sob a perspectiva da possibilidade de delegação do poder de polícia, pois sobre isso o Supremo já se manifestou pela possibilidade). E isso porque é duvidoso – e mais uma vez ressalto que essa é uma análise perfunctória – se meras cartas trocadas entre contratantes, somadas ao ato de reconhecimento de dívida, são instrumento idôneo que embase a relação jurídico administrativa entre a Agetran e o Consórcio”, explica o juiz no documento.

Ele continua que a contratação do Consórcio deveria ter passado por um aditamento (quando é colocado um adendo a um contrato já existente, que tem como objetivo acrescentar, modificar ou excluir cláusulas), dispensa de licitação ou de qualquer outro instrumento legítimo, “que não o reconhecimento de dívidas, que não poderia jamais anteceder os fatos”.

O juiz ainda deixa o espaço para as partes envolvidas se manifestarem sobre essa irregularidade. Porém, enquanto não há maiores esclarecimentos do executivo municipal e do Consórcio, Almeida diz que “por ora, há fortes indícios da irregularidade da relação contratual estabelecida, o que pode ocasionar a ilegalidade do poder de polícia exercido pela Agetran”.

Diante dessas análises iniciais e outras conclusões emitidas pelo juiz, ele determinou que a agência de trânsito municipal embargue o pagamento de dívidas ao Consórcio, além de suspender as multas dos últimos 12 meses aplicadas pelo monitoramento eletrônico, que teriam refletido em uma arrecadação indevida por parte da administração municipal, que estaria perto de R$ 33 milhões.

O magistrado ainda remete sua decisão ao Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), o que indica que nova ação pode ser aberta a partir do órgão público com relação ao comportamento da autarquia municipal.

Para o autor da ação civil pública, vereador Marquinhos Trad, está claro que houve a prática de improbidade administrativa por parte da entidade municipal.

“Não tenho dúvida de que vai incorrer em improbidade administrativa, eles confessam na ação que não tinham contrato, somente autorizaram a empresa a continuar operando porque seria um serviço essencial, mas esse não é um serviço essencial”, afirma o ex-prefeito.

A reportagem entrou em contato com a Prefeitura de Campo Grande para saber o posicionamento diante das falas do juiz.

“A prefeitura não foi intimada e, tão logo ocorra a intimação, adotará as medidas legais cabíveis, por meio da Procuradoria-Geral do Município, para recorrer da decisão”, comunicou o executivo municipal ao Correio do Estado.

A Ordem dos Advogados do Brasil de Mato Grosso do Sul (OAB-MS) também acompanha a situação e informou que, após uma reunião da Comissão de Trânsito da entidade, deverá publicar até sexta-feira um manifesto com sua conclusão sobre os fatos.

Além disso, o presidente da Comissão, Marcelo Vieira, fez um requerimento à Agetran para solicitar que seja enviado à entidade os locais onde estão localizados esses radares, alvo da ação civil pública.

Segundo Marquinhos, “caso julgada procedente ação popular e transitada em julgado”, todos aqueles que já pagaram as multas aplicadas após o vencimento do contrato original de radares – que data de 5 de setembro de 2024 – terão direito ao ressarcimento integral dos valores atualizados.

LICITAÇÃO

A “novela” dos radares em Campo Grande vem se arrastando há quase um ano e meio. De 2018 a 2024, a gestão desses equipamentos em Campo Grande foi feita pelo Consórcio Cidade Morena, que anotou o máximo de aditivos permitidos no período, 7 no total, que somaram R$ 54.820.284,75.

Porém, no dia 5 de setembro do ano passado, este contrato chegou ao fim. Mesmo assim, os radares continuaram multando os campo-grandenses após o término do acordo, mas sem nenhuma oficialização de renovação no prazo, o que seria ilegal.

Sem os radares e suas respectivas multas, com base nos dados de arrecadação da Agetran, a pasta da Capital deixa de contar com cerca de R$ 3 milhões ao mês, conforme balanço feito pelo Correio do Estado no ano passado.

Em maio, a Prefeitura de Campo Grande lançou a licitação para empresas interessadas em administrar o monitoramento eletrônico da cidade, com gasto estimado em R$ 50.255.742,97. Três meses depois, a empresa paulista Serget Mobilidade Viária venceu o processo licitatório, com um lance de R$ 47.994.235,00, um deságio de 4,5% em relação ao previsto pelo executivo.

Curiosamente, esta “nova empresa” vencedora não é tão nova assim. O Consórcio Cidade Morena era formado por três empresas: Perkons SA, Fiscal Tecnologia e Automação e Serget Mobilidade Viária Ltda. Ou seja, a gestão dos radares passou das mãos de três empresas, para apenas uma delas.

Os radares de Campo Grande foram desligados no último dia de agosto, ou seja, a cidade amanheceu no dia 1º de setembro com os aparelhos fora do ar, sem funcionamento. Portanto, em teoria, as infrações no trânsito estão sendo autuadas pelos Guardas Civis Metropolitanas (GCM), visto que o monitoramento eletrônico está fora do ar.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *