CNJ abre nova frente para punir alvos da Operação Ultima Ratio da Polícia Federal, agora, pela via disciplinar
O combate a possíveis casos de corrupção no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) ganhou um novo capítulo nesta semana. Além da investigação contra desembargadores, servidores e advogados que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também entrou nos fatos apurados no bojo da Operação Última Ratio e manteve o afastamento de quatro dos desembargadores e ex-desembargadores investigados por vendas de decisões judiciais, as chamadas “vendas de sentenças”.
Decisões – elas ocorreram em procedimentos separados – do corregedor-geral de Justiça, Mauro Campbell, mantiveram os desembargadores Sideni Soncini Pimentel, Vladimir Abreu da Silva, Alexandre Aguiar Bastos e Marcos José de Brito Rodrigues longe de seus gabinetes por mais 180 dias (aproximadamente seis meses).
Com a decisão, agora em esfera administrativa, esses quatro desembargadores investigados por corrupção estão impedidos de acessar seus gabinetes no TJMS e também de atuar profissionalmente em seus ofícios.
Mauro Campbell, em sua decisão, sinalizou que o afastamento dos desembargadores poderá se estender por mais tempo. No caso específico do desembargador Marcos José de Brito Rodrigues, ele afirmou que os fatos apurados no bojo da Operação Última Ratio e levados à Corregedoria Nacional de Justiça são graves, e que considera necessário o afastamento dele por 180 dias.
Campbell ainda acrescentou ao final: “Enquanto se aguarda a finalização das apurações em seu desfavor”, afirmou.
“Marcos José de Brito Rodrigues, na condição de desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, muito possivelmente, atuou em processos nos quais as partes tiveram seus interesses patrocinados por advogados que dispunham de grande proximidade com o magistrado, assim como, supostamente, recebeu vantagem indevida por intermédio de terceiros”, indicou Campbell, ao decidir pelo afastamento.
A decisão de Mauro Campbell é mais uma ducha de água fria para a defesa dos desembargadores, que contavam que o ministro do Supremo Tribunal Federal, Cristiano Zanin não renovaria o afastamento após o fim do prazo, permitindo que eles retornassem às atividades.
Apura-se que a tendência – no curto e no médio prazo – é que decisões terminativas e mais duras contra os investigados que estão em atividade no Poder Judiciário virão do CNJ, e não do STF.
No processo relatado por Zanin é aguardada uma possível denúncia em vários crimes, o principal deles corrupção, contra os investigados. Em abril último, o delegado responsável pela investigação, Marcos Damato, pediu à Procuradoria-Geral da República que os denuncie por estes crimes.
A investigação
A Operação Última Ratio foi desencadeada em 24 de outubro do ano passado. Naquele dia, policiais federais, munidos de mandados de busca e apreensão concedidos pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça, Francisco Falcão, ingressaram em gabinetes de desembargadores, ex-desembargadores, escritórios de advocacia e servidores do Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul.
Além dos quatro desembargadores já citados, também foi afastado, na ocasião, o presidente da Corte na época, Sérgio Martins. Ele conseguiu retornar às suas funções no início deste ano, por determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal, Cristiano Zanin, a quem o caso foi redistribuído.
A razão da redistribuição, em que um grau de jurisdição no foro especial foi escalado, é porque havia a suspeita de que o esquema de venda de sentenças também atingisse ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O esquema de corrupção também atingiu o conselheiro do Tribunal de Contas, Osmar Jeronymo, dois sobrinhos dele – um advogado e outro servidor do TJMS –, advogados, inclusive filhos de desembargadores, como os filhos de Sideni Pimentel e Vladimir Abreu. Desembargadores aposentados, como Júlio Roberto Siqueira Cardoso e Divoncir Schreiner Maran, também estão entre os alvos.
O esquema de corrupção, conforme a Polícia Federal, teria lesado vários direitos de cidadãos, por meio de decisões juridicamente questionáveis, e envolvia uma grande quantia em patrimônio.
É o caso, por exemplo, de decisão de Alexandre Bastos e Sideni Pimentel, que validaram um golpe milionário na compra de uma fazenda no Pantanal avaliada em R$ 15 milhões. Em suas decisões, eles simplesmente desprezaram um vício no contrato de compra e venda, constatado pelo Ministério Público, que acusou os compradores – que falsificaram certidões – de estelionato.
Os desembargadores investigados também levaram adiante uma execução contra o Banco do Brasil com prêmio semelhante ao de uma Mega-Sena: R$ 178 milhões.
Curiosamente, o valor seria pago na forma de honorários advocatícios aos filhos do desembargador Vladimir Abreu da Silva e ao advogado Felix Jayme Nunes da Cunha, apontado como lobista do esquema.
A “dívida” tem origem em uma execução promovida pelo Banco do Brasil de um financiamento agrícola contraído por um casal de Três Lagoas na década de 1990 – dívida essa que nunca foi paga – e que prescreveu em 2018, por falta de bens penhoráveis.
No entanto, em 2019, ao chegar ao TJMS, a dívida se transformou em um passivo significativo para o banco: um honorário sucumbencial de R$ 178 milhões, valor a ser pago aos advogados da ação.