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Funcionários reutilizam água do ar-condicionado e viram inspiração para universidade inteira

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Biotério da UFMS reutiliza 130 litros de água por dia nos serviços de limpeza e irrigação das plantas

 

Um grupo de servidores públicos tomou uma iniciativa que virou inspiração para uma universidade inteira. Os funcionários do Biotério Central da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), em Campo Grande (MS), montaram eles próprios estruturas simples, mas eficientes para reaproveitar a água que sai dos aparelhos de ar-condicionado do setor. Com isso, estão reutilizando 130 litros de água por dia.

O líquido é coletado por meio de canos de 100 mm e dois metros de comprimento instalados em oito aparelhos do Biotério. Outros 11 equipamentos também receberão a estrutura nos próximos dias. A água é usada para lavar os corredores, calçadas e sanitários, além de irrigar o jardim que, aliás, está verdinho. A instalação começou experimentalmente no mês de Fevereiro e desde Maio não se usa mais água potável no serviço de limpeza do local.

A água tratada servida por meio do encanamento não é mais necessária para este trabalho. Agora, o pessoal da limpeza e manutenção agora abre a torneirinha instalada no cano azul e retira o líquido eliminado pelo aparelho de ar-condicionado e enche os baldes para o serviço de asseio do setor. A nova fonte de água virou motivo de orgulho, pois representa mais do que economia financeira. É um belo exemplo de conscientização ambiental.

Reúso de água vira inspiração em universidade
Primeiro cano instalado no Biotério recolhe água de dois aparelhos de ar-condicionado (Foto: Luiz Alberto)

No Biotério da UFMS parte dos equipamentos fica ligada 24 horas por dia. A climatização é fundamental para o trabalho exercido no setor. Nas, salas do Biotério são produzidos animais essenciais para pesquisas, tais como ratos e camundongos. São cerca de quatro mil por ano destinados a estudiosos de universidades públicas e privadas de MS, São Paulo e Paraná. Usando os animais, os pesquisadores testam novos medicamentos e ensaios no área da psicologia, por exemplo.

Com uma tarefa tão complexa e necessária à ciência, o Biotério da UFMS controla a temperatura dos ambientes com muito rigor e agora assumiu o controle também da água eliminada pelos aparelhos de ar-condicionado. “O mais interessante é que a ideia surgiu espontaneamente, da observação de algo precisava ser feito. Não foi uma determinação de chefia”, relembra a  médica veterinária  Adriana Guercio, uma das responsáveis técnicas do setor.

Os funcionários olhavam incomodados para o desperdício daquela água e nas marcas que ela causava. O líquido escorria deixando manchas escuras e de aparência desagradável nas paredes e calçadas. Um dia os funcionários começaram a dialogar sobre o assunto e ideias foram surgindo. Alguns como técnico de laboratório Jonas Magalhães Moreira recorreu a pesquisas na internet em busca de ideias de aproveitamento da água.

Reúso de água vira inspiração em universidade
Leonardo Chaves, Adriana Guercio e Jonas Magalhães (Foto: Luiz Alberto)

“Eu pesquisei ideias já implantadas em outras localidades e que poderiam servir de inspiração para algo adaptável à nossa realidade. Ao final, pensando em grupo, chegamos à instalação dos canos, como sendo uma opção de fácil instalação e viável para nós”, relembra Jonas Magalhães.

Em Fevereiro deste ano, a ideia começou a se concretizar. Os funcionários providenciaram um cano de PVC para captar a água. Os primeiros materiais vieram das casas de alguns deles, como as braçadeiras e parafusos para prender o cano, as torneiras e posteriormente, a tinta azul para fazer a pintura. Com o sucesso da experiência, mais canos canos e torneiras foram chegando e sendo instalados nos aparelhos de ar-condicionado.

A notícia da ação correu pela universidade e virou alvo de elogios. O diretor de Desenvolvimento Sustentável, Leonardo Chaves de Carvalho, revelou que a iniciativa será copiada por outros setores da universidade. A UFMS tem mais de dois mil aparelhos de ar-condicionado considerando a Capital e os campi do interior do Estado. Agora, a universidade pretende instalar o mesmo sistema que é simplório, de baixo custo, mas eficiente, no máximo de equipamentos que conseguir.

Reúso de água vira inspiração em universidade
Canos e torneiras foram providenciados pelos próprios funcionários (Foto: Luiz Alberto)

O diretor explica que não será necessário gastar dinheiro público com a tarefa. Não será aberta licitação ou aviso de compras específico. A ideia é usar os materiais que a universidade já tiver disponíveis em seus campi e instalar nos aparelhos de ar condicionado para coletar a água. “A iniciativa deles nos ensinou muito sobre proatividade. Eles próprios iniciaram a discussão, viabilizaram os materiais, instalaram e pintaram. Vamos trabalhar essa questão de forma educativa na universidade, sem regras ou imposições, mas como conscientização”, detalha.

Adriana Guercio, a médica veterinária do Biotério, exibe várias contas que atestam a relevância da iniciativa para o meio ambiente. Cada aparelho elimina cerca de dois litros de água por hora, de forma que são 48 litros por dia, considerando aqueles equipamentos que funcionam 24h. Segundo ela, a economia é de 0,13 m³ por dia, o equivalente a 3,9 m³ por mês. Isto daria algo em torno de R$ 150 mensais.

“A expectativa é economizar R$ 1,8 mil em 12 meses. Os números revelam a questão financeira, que neste momento parece pequena, mas acredito que o grande impacto da ação é de conscientização ou comportamental.  Ela mostra que pequenas atitudes e baratas evitar desperdícios que tem muita relevância para o meio ambiente. Agora, à medida que outros setores forem incorporando a ideia a economia cresce e todo o planeta ganha com isso”, avalia.

Reúso de água vira inspiração em universidade
No Biotério da UFMS, onde se produz animais para pesquisas, climatização é fundamental (Foto: Luiz Alberto)

Já Leonardo Chaves destaca que a iniciativa do pessoal do Biotério está em sintonia com a  Política de Sustentabilidade da UFMS, atualizada em 2022, e alicerçada nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas. Ele pretende, inclusive, que a ação de reutilização de água se destaque em prêmio nacional que avalia práticas de sustentabilidade em instituições públicas, no qual a UFMS será inscrita.

Quando e como posso usar a água do ar-condicionado? A iniciativa da turma do Biotério da UFMS é realmente estimulante. A essa altura, o leitor deve estar imaginando formas de seguir o exemplo em casa ou na empresa em que trabalha.  Bem por isso, um especialista no assunto detalhou quando e como se deve usar  a água do ar-condicionado com segurança.

Reúso de água vira inspiração em universidade
Água do ar-condicionado é usada para serviços de limpeza (Foto: Luiz Alberto)

O engenheiro mecânico, professor e mestre da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) Raphael Ceni Gomez responde aos questionamentos sobre o assunto. Veja entrevista abaixo:

É aconselhável usar essa água para regar as plantas?

Raphael Ceni – Essa água é proveniente da condensação do vapor de água presente no ar e, como tal, possui baixa concentração de minerais essenciais, o que pode limitar seu uso. O uso contínuo em plantas pode levar à deficiência nutricional do solo. Nestes casos é interessante usar essa água alternadamente com água comum para evitar impactos negativos a longo prazo. Também é importante considerar o Ph, e utilizar em plantas que toleram pH ácido.

Que tipos de plantas são aconselháveis, grama, por exemplo?

Raphael Ceni – Plantas com menor exigência nutricional, como gramados, plantas ornamentais e espécies rústicas, são mais adequadas para a irrigação com essa água. Gramados, por exemplo, são bastante resilientes e se beneficiam da hidratação regular, mesmo com água de baixa concentração mineral. Plantas que demandam maior quantidade de nutrientes ou são sensíveis ao pH da água devem ser irrigadas com uma mistura de água do ar-condicionado e água potável rica em minerais.

Reúso de água vira inspiração em universidade
Plantas ornamentais e espécies rústicas, são mais adequadas para a irrigação com água do ar condicionado, explica professor (Foto: Luiz Alberto)

Qual o uso mais adequado para esta água?

Raphael Ceni – A água proveniente de sistemas de ar-condicionado é mais indicada para usos que não exijam água potável. Exemplos incluem limpeza de pisos, lavagem de veículos, reuso em descargas sanitárias e irrigação de áreas verdes menos exigentes. Esses usos otimizam o aproveitamento do recurso sem comprometer a qualidade dos serviços ou a saúde dos usuários.

O pH dessa água é mais alto?

Raphael Ceni – Normalmente, a água coletada de sistemas de ar-condicionado possui um pH que varia de levemente ácido a neutro, situando-se geralmente entre 6,0 e 7,0. Isso se deve às partículas presentes no ar e ao processo de condensação. Embora o pH possa ser considerado adequado para alguns usos, recomendo que seja medido antes de aplicá-la em sistemas que requerem controle rigoroso do pH, como em processos industriais ou em cultivos agrícolas sensíveis. É importante lembrar as propriedades da água dependem da região, da qualidade do ar, da manutenção e limpeza do ar condicionado e também do reservatório em que ficará armazenada.

Reúso de água vira inspiração em universidade
Água coletada de sistemas de ar-condicionado possui um pH que varia de levemente ácido a neutro (Foto: Luiz Alberto)

Pode-se usar em veículos automotores?

Raphael Ceni –   Sim, a água coletada dos aparelhos de ar-condicionado é adequada para uso em sistemas automotivos, como em radiadores e no reservatório do limpador de para-brisa. Por ser praticamente desmineralizada, sem a presença de cloro ou fluor, ela minimiza a formação de depósitos minerais em componentes automotivos sendo até melhor que água de torneira. No entanto, ainda é inferior a água de fato desmineralizada e neste caso é fundamental garantir que essa água esteja livre de contaminantes, como poeira ou partículas que possam se acumular no sistema.

Não se pode beber, mesmo se ferver, certo?

Raphael Ceni –  Correto. Esta água não é adequada para consumo humano, mesmo após fervura. A fervura pode eliminar alguns microrganismos, mas não garantirá a remoção de todos os contaminantes químicos ou biológicos que possam estar presentes. Além disso, a falta de minerais essenciais faz com que essa água não seja adequada para hidratação.

Também não se pode dar essa água aos pets?

Raphael Ceni – Exato, essa água não é recomendada para consumo por animais de estimação. Assim como para humanos, os pets precisam de água que contenha os minerais necessários para a saúde, além de estar livre de contaminantes.

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