A síndrome do esgotamento profissional não começa do dia para a noite. Reconhecer os sinais de alerta é fundamental para evitar que o problema avance
Alguma dose de stress faz parte da rotina da maioria das pessoas no trabalho. No entanto, ficar com os nervos à flor da pele com frequência pode desencadear uma condição grave: o burnout.
Segundo a pesquisa Estado do Ambiente de Trabalho Global 2023, da Gallup, o stress nas empresas de todo o planeta continua em níveis recordes desde a pandemia. Em 2022, 44% dos funcionários se declararam estressados, o mesmo patamar de 2021 e 1 ponto percentual a mais que em 2020. Em 2019, antes da Covid-19, os estressados representavam 38% dos participantes do estudo.
Flávia Zuccolotto, psiquiatra do Hospital Oswaldo Cruz, explica que o stress é uma reação fisiológica e comportamental a ameaças percebidas pelo indivíduo. Já o burnout é uma resposta do corpo, da mente e das emoções a um stress constante no ambiente de trabalho. A condição é fruto de um desgaste crônico não tratado, que pode causar consequências sérias para a saúde física e mental.
“O termo ‘burnout’ deriva da ideia de algo que queima. O corpo emite sinais que, muitas vezes, são negligenciados por fatores culturais”, diz a médica.
Neste ano, a síndrome foi incluída pela Organização Mundial de Saúde (OMS) na 11ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11) como um fenômeno ocupacional. O burnout também entrou na atualização da lista de doenças relacionadas ao trabalho (LDRT) do Ministério da Saúde.
Quais são os sintomas do burnout?
Os sintomas e sinais do burnout são diversos e impactam não apenas o desempenho profissional, mas também a saúde geral da pessoa.
A condição que se desenvolve do dia para a noite. “Primeiro, a pessoa fica em estado de alerta, mobilizando muita energia para superar aquele desafio que a está estressando. Depois, vai para uma fase de tentar ficar resistente, esticando a corda ao máximo para dar conta de tudo. Na terceira fase, vem a quase exaustão. Geralmente é nesse momento que começam a aparecer sintomas físicos”, explica a médica do Oswaldo Cruz.
A psiquiatra destaca os alertas mais comuns:
– Esgotamento de energia: A pessoa tem uma sensação de fadiga extrema que persiste, independentemente do repouso. É um cansaço tanto físico quanto mental;
– Distanciamento: O indivíduo se afasta mentalmente da atividade profissional, tornando-se menos ativo e presente. Pode chegar atrasado, faltar ou ir ao escritório e se sentir paralisado, por exemplo. “Ele não consegue mais estar integrado ao ambiente ou pode ter sentimentos negativos, como raiva e cinismo, relacionados ao seu trabalho”, diz a médica;
– Ansiedade: Pode haver manifestação de tremor, mal-estar e sensação eminente de que algo ruim vai acontecer, com pensamentos negativos e ruminantes;
– Alterações no sono: Excesso de sonolência e, principalmente, insônia podem aparecer na síndrome. O diagnóstico de insônia é caracterizado pela dificuldade para iniciar ou manter o sono ou ainda acordar antes do horário desejado, mais de três vezes na semana;
– Falta de foco: A síndrome causa um impacto cognitivo. A pessoa perde a chamada memória de fixação e não consegue sustentar a atenção. Acaba de ouvir alguma coisa e esquece na sequência. “Muitos pacientes chegam ao consultório acreditando que têm transtorno de déficit de atenção, quando, na verdade, estão exaustos”, afirma a psiquiatra;
– Dores: A pessoa pode sentir cefaleia, desconfortos musculares e outras dores pelo corpo;
– Distúrbios gastrointestinais: Náusea e diarreia são sintomas comuns associados ao burnout;
– Isolamento social: A doença interfere em outras áreas da vida também. “A pessoa reserva a pouca energia que tem para o trabalho. Não sobra nada para o resto. A vida social, afetiva e familiar fica comprometida, e ela deixa de fazer coisas de que gostava”, aponta a médica.
Fatores de risco
Alguns fatores favorecem o desenvolvimento do burnout. Entre eles, estão aspectos individuais, como personalidades perfeccionistas e controladoras, e idealização do cargo ocupado.
Há também características organizacionais, a exemplo das empresas com falta de autonomia, excesso de rigidez e comunicação pouco assertiva. Além disso, questões econômicas e políticas também desempenham um papel sobre o stress.
Prevenção e tratamento de burnout
Prevenir o burnout requer abordagens tanto individuais quanto organizacionais. “Trabalhar em um ambiente favorável à saúde mental, que respeite limites de carga horária, é crucial”, aponta a médica. Pausas regulares, prática de atividade física e fortalecimento de outras áreas da vida são estratégias eficazes.
O diagnóstico do burnout é clínico, sem a necessidade de exames complementares. O tratamento envolve frequentemente o afastamento do ambiente estressante e o cuidado com as comorbidades associadas. A terapia comportamental e, às vezes, medicamentos são componentes-chave do processo de recuperação.