Ministério Público investiga danos morais e materiais às famílias que pagaram, mas não receberam o imóvel prometido
O Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) investiga o caso de 85 unidades habitacionais prometidas em 2019 por uma empresa campo-grandense como parte do programa social Minha Casa, Minha Vida e que até agora não saíram do papel, no interior do Estado.
Há seis anos, a prefeitura de Amambai realizou um chamamento público e a construtora Groen Engenharia e Meio Ambiente Ltda. saiu como vencedora para a edificação de 85 moradias pelo programa federal, no chamado de Residencial Analy localizado no primeiro quilômetro da rodovia MS-386. Inclusive, o Executivo municipal foi responsável pela doação dos lotes que comporiam o condomínio.
De acordo com os detalhes do contrato de compra e venda entre a empresa e uma das beneficiadas, o valor total das moradias era de R$ 133,5 mil, com uma entrada de R$ 26,7 mil –deste valor, R$ 14.816,89 eram pagos pela prefeitura e o restante da entrada conforme desejo do interessado. Os outros R$ 106,8 mil seriam pagos por meio de financiamento bancário.
Neste documento, a empresa afirmava que o prazo para conclusão da obra era de até 24 meses após assinatura do contrato com a Caixa Econômica Federal, conforme o cronograma físico-financeiro do banco. Porém, até o momento, as obras nem começaram e, segundo consta no inquérito civil, “tampouco obteve a aprovação final do projeto junto à Caixa Econômica Federal”.
Em 2024, diante do constante atraso, o município instaurou processo administrativo rescisório, a fim de encerrar o acordo com a construtora de forma unilateral.
Em resposta, a Groen Engenharia e Meio Ambiente afirmou que o projeto não teria saído do papel por quatro motivos: a indisponibilidade e a indefinição das 85 matrículas; as regras a serem aplicadas ao programa Minha Casa, Minha Vida foram redefinidas quando o programa foi alterado para Casa Verde e Amarela; a pandemia mundial da Covid-19; e a Caixa Econômica Federal ter solicitado que a prefeitura alterasse a Lei Municipal nº 2.690/2019, o que foi realizado em novembro de 2023.
Acerca do programa Minha Casa, Minha Vida, a construtora afirmou que realmente o acordo não foi celebrado, visto que, “por se tratar de um empreendimento de caráter coletivo, onde havia a doação de um terreno público para os futuros adquirentes, não se era admitido o financiamento do empreendimento”.
Mesmo com as justificativas citadas, elas não foram aceitas pela Procuradoria-Geral do município, persistindo na decisão pela rescisão, que foi firmada em dezembro do ano passado. Com a questão administrativa resolvida, o MPMS redirecionou o foco para os danos causados aos consumidores, com a prefeitura de Amambai afirmando que os lotes foram mantidos para serem usados em um novo programa no futuro e que sua participação no projeto se limitou ao credenciamento da empresa e à doação dos terrenos.
Em defesa, a Groen disse que cumpriu as exigências do chamamento público, mas que sofreu “entraves alheios a sua vontade” e que não foi acionada para as tratativas iniciais pelo Executivo municipal. Diante dos pontos expostos, o órgão instaurou notícia de fato, a fim de iniciar os procedimentos investigatórios e, depois, o inquérito civil.
Em outro documento presente no processo, o MPMS revelou que oito beneficiários já demonstraram interesse em receber o dinheiro de volta, já que não receberam as casas. Juntos, somam quase R$ 60 mil.
“Pelo exposto, resolvo converter a presente notícia de fato em inquérito civil, com o objetivo de apurar a responsabilidade da empresa Groen Engenharia e Meio Ambiente Ltda pelos danos materiais e morais, individuais e coletivos, decorrentes da inexecução do contrato para a construção de 85 unidades habitacionais no ‘Residencial Analy’, bem como adotar as medidas cabíveis para a reparação dos consumidores lesados”, determinou o promotor de Justiça André Luiz de Godoy Marques.
OUTRA INVESTIGAÇÃO
A Groen já esteve envolvida em outra polêmica no interior de Mato Grosso do Sul. Em maio do ano passado, a Polícia Federal (PF), em conjunto com a Controladoria-Geral da União (CGU), deflagrou a Operação Pedra de Toque, para apurar o cometimento dos crimes de fraude ao procedimento licitatório, peculato, apropriação, associação criminosa e prejuízos financeiros causados à administração pública pela prefeitura de Três Lagoas.
As investigações começaram a partir de informações anônimas, com uma auditoria instaurada em seguida, a qual concluiu que houve irregularidades na adesão, pelo Executivo municipal, à ata de registro de preços de órgão federal para serviços de engenharia.
“Os auditores apuraram que houve direcionamento indevido da contratação para uma determinada empresa em detrimento de outras opções mais vantajosas, resultando em prejuízos financeiros significativos. A Polícia Federal aprofundou a investigação, confirmando os apontamentos realizados pela CGU e identificando necessidade de fase ostensiva”, disse a PF.
Segundo levantamento, a empresa recebeu pagamentos da prefeitura que totalizaram, aproximadamente,
R$ 107 milhões, de 2017 a 2021, e parte desses recursos tinha origem em repasses federais para a área da Saúde.
A modalidade Minha Casa, Minha Vida – FGTS, que seria a deste contrato entre Amambai e a construtora, é destinada às famílias com renda mensal bruta de até de R$ 8.600,00 por meio de aportes públicos (estados, municípios e União).