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Mulher baleada em posto de gasolina “passou por uma grande batalha”, diz filho

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Após ter sido baleada seis vezes pelo ex-companheiro, na quinta-feira (29), a vítima passou por cirurgia e está no quarto

 

Edson Matheus, de 28 anos, filho da mulher que foi baleada pelo ex-companheiro, que não aceitou a separação, informou que a mãe levou seis tiros e, ao dar entrada na Santa Casa, passou por aproximadamente sete horas de cirurgia.

Em conversa, Edson Matheus relatou que as balas atravessaram o corpo da mulher, que teve o intestino perfurado e um dos pulmões atingido.

A cirurgia terminou por volta das 22h. O filho, que não deixou o hospital desde a tentativa de feminicídio, narrou o episódio como “uma grande batalha”, a qual a mulher venceu.

Apesar de ter ficado algumas horas no Centro de Terapia Intensiva (CTI), ela reagiu bem ao procedimento.

Com a melhora, a equipe médica liberou a paciente para permanecer no quarto, acompanhada pelo filho, que escutou o horror que ela sofreu nas horas em que permaneceu no veículo com seu algoz.

“A gente sofreu bastante com o acontecido. Eu estou aqui desde ontem, sem comer, sem dormir, só ao lado da minha mãe. Orando, mandando energias positivas e buscando justiça. Eu quero justiça, para que isso não fique impune”, disse o filho. E completou:

“Não só pela minha mãe, mas por todas as mulheres. Eu sou casado, tenho uma esposa linda, uma filha maravilhosa. Então, tenho que zelar por esse respeito, porque preciso ser exemplo dentro da minha casa. Se eu vejo uma coisa dessas e me omito, fico quieto, estou sendo um péssimo filho, um péssimo marido, um péssimo pai.”

Sequestro

Em ocasiões anteriores, ela tentou conversar com o companheiro para pôr fim ao relacionamento de maneira amigável, mas ele ficava nervoso e, por saber que o ex tinha uma arma, ela acabava se silenciando.

A vítima só conseguiu deixar a residência quando Marcos Antônio viajou para Jardim. Ela pegou seus pertences e fugiu, escondendo-se do ex por três meses. Nesse ínterim, entrou com o processo de divórcio.

O homem a seguiu. Por meio de imagens de câmeras de segurança, é possível ver quando o Hyundai HB20 passa, faz o retorno e intercepta o caminho dela. A mulher volta caminhando; Marcos Antônio se aproxima, eles trocam algumas palavras e ela entra no carro.

Nesse momento, a polícia recebeu uma denúncia de que a mulher poderia ter sido vítima de sequestro. A ocorrência já estava em andamento, enquanto, dentro do veículo, a vítima era repetidamente questionada se estava com outro homem.

“Ele perguntava se ela tinha outro. A todo momento, ele insistia nisso. Só que a minha mãe não estava com ninguém, estava apenas trabalhando. Nem saía de casa, estava bem escondida e com medo de algo acontecer”, contou Edson Matheus.

Como precisava trabalhar, ela acabou sendo localizada por Marcos, que a manteve no carro até ser convencido a parar em um posto de gasolina, local onde a vítima tentou fugir e foi baleada mesmo já caída no chão.

Sentimento de posse

A delegada Analu Ferraz, da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), afirmou que, durante o interrogatório, o suspeito tratava a vítima como um objeto de sua posse.

“Ele a trata como se ela fosse dele. O interrogatório durou cerca de uma hora e ele confirmou essa visão, de que ela era dele, e que não aceitava o fim do relacionamento”, explicou Analu.

A delegada disse que existem registros de violência doméstica contra Marcos Antônio de Souza Vieira em outros municípios, como Jardim, Bonito e região.

O único registro feito em Campo Grande foi justamente o que levou à concessão de uma medida protetiva, que a vítima pediu para revogar em dezembro de 2024.

Quanto à arma, ele não possuía documentos, e a delegada deixou claro que se tratava de armamento ilegal.

Lobo em pele de cordeiro

Marcos Antônio de Souza Vieira, de 59 anos, natural de Jardim, foi descrito pelo filho da vítima como alguém que não demonstrava agressividade. Segundo ele, o homem passava a imagem de “príncipe”, de uma pessoa maravilhosa.

A assistente de educação infantil, de 46 anos, conheceu Marcos Antônio por meio das redes sociais. O filho informou que eles conviveram juntos por pouco mais de três anos.

Com medidas protetivas e usando tornozeleira eletrônica, o filho contou que o agressor conseguiu convencer a vítima de que iria mudar.

Por fim, ela acabou se sentindo mal por ter procurado a polícia e, ludibriada, pediu perdão pela denúncia e decidiu retirar o pedido na Justiça contra o ex.

“Ele era bom de lábia, a minha mãe o perdoou e pediu perdão. Ela, que era a vítima, saiu como errada da história, entendeu?”, relatou o filho.

Sem direito a existir

Após assistir ao vídeo em que Marcos Antônio admite a tentativa de feminicídio, a psicóloga Carlota Philippsen comentou que, para alguns homens, ainda prevalece a ideia de que mulheres são “posse”.

“Isso remonta a muito tempo, como se a gente fosse propriedade privada deles. Essa coisa da mulher ser mantida no lar… Inclusive, isso perpassa algo muito comum e, às vezes, invisível: o assédio que sofremos nas ruas. Como se existíssemos no mundo em função dos homens, para agradá-los, servi-los, gerar e criar os filhos deles”, disse a psicóloga.

Segundo a especialista, mesmo quando constituem outras famílias, muitos homens mantêm o pensamento de que a ex ainda lhes pertence.

“Isso fica muito claro na fala dele. Aquela ideia: ‘se é minha, não vai ser de mais ninguém’, o que denota, sim, uma visão de posse.”

Em situações de violência doméstica, Carlota explicou que é comum mulheres pedirem medidas protetivas, mas depois as retirarem ou voltarem para o agressor, muitas vezes em razão da forma como foram educadas.

“Somos um dos grupos oprimidos que dorme com o próprio opressor. Isso nos leva a pensar que podemos transformá-lo, que nosso amor será suficiente. Muitas acreditam que ele nunca foi amado e que, se for, mudará. Temos sempre essa esperança de que ele pode mudar.”

Um ponto levantado pela psicóloga é a ausência de um nome adequado para os fatos: o termo correto seria “violência masculina contra mulheres”, o que permitiria dar visibilidade ao agente da agressão, algo que não distingue classe social e pode afetar todas as mulheres.

“Então fica aquela coisa meio oculta: quem é que violenta as mulheres? Existe uma certa dificuldade de nos colocarmos nesse lugar. Vemos a outra sendo agredida, violentada… mas, quando acontece com a gente, temos dificuldade de reconhecer. Nós também podemos passar por isso.”

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