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Violência patrimonial: saiba o que é e como identificar

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Embora ainda seja pouco discutida, a violência patrimonial tem impacto na independência financeira e na saúde mental da mulher

 

 

Você já ouviu falar em violência patrimonial? Este tipo de violência muitas vezes cometida contra a mulher se caracteriza por qualquer ação ou omissão que comprometa a integridade dos bens e recursos econômicos da vítima. Isso inclui desde a destruição de objetos pessoais e retenção de documentos até o controle financeiro abusivo e a proibição de trabalhar ou estudar. Como resultado, acaba limitando a independência financeira da mulher, mantendo-a sob o domínio do agressor.

Embora essa forma de violência seja uma realidade para muitas mulheres, a subnotificação ainda é alarmante. Em 2020, o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos registrou somente 3 mil denúncias relacionadas a crimes contra a segurança financeira das mulheres. Esse número contrasta com as 106,6 mil denúncias de violência psicológica no mesmo período, evidenciando a falta de reconhecimento desse tipo de abuso. Dados revelam que a Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180, registrou 750,7 mil denúncias em 2024.

Em média, foram 2.051 chamados por dia. Assim, desses, 132.084 foram denúncias de violência contra a mulher, representando um aumento de 15,2% em relação a 2023. Das denúncias realizadas, 83.612 partiram das próprias vítimas e 48.316 foram feitas por terceiros. A fundadora e CEO do Instituto Mulheres do Imobiliário, Elisa Rosenthal, avalia que apesar do aumento das denúncias, a violência patrimonial ainda é pouco compreendida e muitas vezes negligenciada.

“O desconhecimento sobre esse tipo de agressão faz com que inúmeras mulheres permaneçam em situações abusivas sem perceberem que estão sendo vítimas de um crime. O controle sobre a vida financeira, a manipulação de bens e a dependência forçada impedem que muitas mulheres rompam com o ciclo da violência, dificultando sua autonomia e segurança”, avalia.

Sinais da violência patrimonial

Identificar a violência patrimonial pode ser um desafio, pois muitas vezes ocorre de forma sutil e progressiva. No entanto, alguns sinais indicam que uma mulher pode estar sendo vítima de violência patrimonial. São eles:

  • Controle financeiro excessivo: o parceiro impede que você tenha acesso ao próprio dinheiro, exige justificativas para todos os seus gastos ou impõe limites rígidos no diálogo;
  • Proibição de trabalhar ou estudar: a mulher é desencorajada ou impedida de buscar emprego, abrir um negócio ou continuar seus estudos;
  • Retenção de documentos: RG, CPF, passaporte, cartões bancários e outros documentos são mantidos pelo agressor sem consentimento;
  • Uso indevido de bens: dinheiro, imóveis, veículos ou outros patrimônios da vítima são usados sem permissão, ou transferidos para o nome do agressor;
  • Dívidas em nome da vítima: contas, empréstimos ou financiamentos são feitos sem o conhecimento, ou autorização da mulher;
  • Destruição de pertences: objetos pessoais, eletrônicos, roupas e móveis são danificados ou descartados propositalmente,
  • Impedimento de decisões financeiras: a mulher não tem liberdade para administrar seu próprio dinheiro, fazer investimentos ou decidir sobre gastos importantes.

“Em muitos casos, o agressor age de forma sutil, controlando todas as finanças da família, deixando a mulher sem recursos para suas necessidades básicas ou para buscar ajuda. Além disso, a destruição de bens pessoais e a retenção de documentos impedem a mulher de exercer sua cidadania plena e de se inserir no mercado de trabalho”, destaca Adriana de Arruda, psicanalista e planejadora financeira pessoal, especialista em gestão financeira familiar.

Como romper com a violência patrimonial?

O primeiro passo é reconhecer o abuso. Muitas mulheres não percebem que estão presas em um ciclo de violência patrimonial. Isso porque, o controle financeiro excessivo e a destruição de bens podem ser mascarados como “cuidados” ou “gestão financeira familiar”.

Por isso, ao identificar a situação, é essencial buscar apoio jurídico. Registrar um Boletim de Ocorrência na Delegacia da Mulher ou em uma delegacia comum é um passo fundamental para garantir proteção. A Lei Maria da Penha prevê medidas protetivas para resguardar os bens da vítima.

“Buscar a Defensoria Pública ou um advogado especializado em direito de família também é importante para garantir o divórcio, a divisão justa dos bens e patrimônios, e assegurar direitos como pensão alimentícia e partilha de bens, como imóveis”, orienta Elisa.

Contudo, ter um plano de segurança também é essencial. Separar documentos importantes e contar com o apoio de amigos ou familiares pode ser determinante para sair da situação de abuso. “Saber para onde ir em caso de emergência é um passo fundamental para garantir segurança e proteção”, pontua Adriana de Arruda.

Dessa forma, abrir uma conta bancária independente e impedir o acesso do agressor ao salário ou outros recursos é uma estratégia essencial para recuperar a autonomia. Caso haja movimentações suspeitas em contas conjuntas, é possível solicitar auditoria bancária e buscar medidas legais para proteger o patrimônio.

“Quando uma mulher entende como gerenciar seu dinheiro, criar uma reserva de emergência, evitar endividamentos abusivos e fazer investimentos estratégicos, ela reduz sua vulnerabilidade e se fortalece contra possíveis abusos financeiros”, acrescenta Adriana.

Impacto na saúde mental da mulher

A violência patrimonial tem efeitos devastadores na saúde mental das mulheres, comprometendo sua autonomia e gerando um sofrimento psicológico intenso. “O medo da instabilidade financeira e a falta de controle sobre os próprios recursos criam um estado constante de ansiedade e estresse. Além disso, a perda da autonomia financeira pode levar à desmotivação e a sentimentos de impotência, favorecendo quadros de depressão e falta de esperança no futuro”, afirma a psicanalista Ana Tomazelli, presidente do Instituto de Pesquisa de Estudos do Feminino (Ipefem).

De acordo com a especialista, a dependência financeira também impacta diretamente a autoestima e a segurança emocional da mulher, minando sua confiança nas próprias decisões. “Muitas vítimas passam a viver em estado de alerta, desenvolvendo transtornos de ansiedade, crises de pânico e até fobias relacionadas ao medo do abandono e da privação material. O desgaste emocional prolongado pode resultar em exaustão mental e burnout, afetando a produtividade e a qualidade de vida”, explica.

No entanto, grupos de mulheres, ONGs, associações e projetos sociais oferecem suporte jurídico, psicológico e financeiro, auxiliando vítimas de violência patrimonial a retomarem suas vidas com mais segurança e dignidade. “Esses espaços permitem trocas de experiências, acesso a informações e encaminhamentos para profissionais capacitados, promovendo um ambiente acolhedor e encorajador”, complementa Tomazelli.

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