logo-kanal

NOVELA PANTANAL: Pantanal mudou a história da telenovela brasileira nos anos 1990

Compartilhar

Há 32 anos acontecia uma revolução na televisão brasileira em seu horário nobre. Pantanal, de Benedito Ruy Barbosa, estreava na Rede Manchete, emissora com apenas sete anos de vida. Na tela, ao invés de cenas do cotidiano urbano, da velocidade do dia-a-dia que a cidade impunha, bem representadas em Rainha da Sucata, exibida na mesma época pela Globo, imagens de um Brasil que poucos conheciam, com fauna e flora exuberantes.

A história é conhecida, tanto a da trama da novela quanto a da saga enfrentada pelo autor para vê-la concretizada. Benedito Ruy Barbosa era conhecido como o autor do horário das seis da tarde, com temas que já abordavam o país rural, mas baseadas em histórias de época. Segundo ele próprio menciona no livro “Autores – Histórias da Teledramaturgia”, da editora Globo, publicado em 2008, e resultado de duas entrevistas, coordenadas por Silvia Fiúza e Ana Paula Goulart Ribeiro, uma em 2000 e outra no ano do lançamento: “Seu Adolpho (Bloch) disse: ‘Não quero saber quanto você ganha na Globo. Pago três vezes mais para você vir fazer essa novela aqui (na Manchete). Eu banco’. Eu topei na hora. Depois fui falar com o Boni e pedi para me liberarem. A única condição para que eu não fosse embora da Globo seria fazer ‘Pantanal’. Como não havia essa possibilidade, fui para a Manchete. ”

Lá estava também Jayme Monjardim, outro ex-Globo, que iria inovar na direção da novela e traçar uma linha divisória entre antes e depois no gênero. Monjardim impôs um outro ritmo às cenas, um andamento diferenciado, muito mais lento ao que se estava acostumado. Em Pantanal primeira edição o protagonismo da história está mais com a natureza que com os próprios personagens. São as belas imagens do bioma pantaneiro que ficam por longos minutos em planos abertos, tomadas aéreas das paisagens, cortes lentos e cenas longas, com tempo para o silêncio das personagens, que não era nada comum até então.

Claro que há o folhetim da ocasião: intrigas aqui e ali, que se entrecruzam, embaralham, na história do peão Joventino e seu filho Zé Leôncio, desde a chegada dos dois ao Pantanal Matogrossense, do surgimento da jovem mimada Madeleine na vida deste último, do nascimento de Jove, e das tramas que envolvem seus dois outros filhos, Tadeu e Zé Lucas do Nada. Mas é a natureza que permanece como a grande estrela, em sua eternidade, quase como uma entidade acima de tudo e de todos na trama. Alguns personagens, como o Velho do Rio e Juma Marruá, se misturam com a própria natureza, são místicos e selvagens, expressam a força e os mistérios dos ciclos da vida, sugerindo, inclusive, um olhar diferente sobre a espiritualidade.

O SALTO DA MANCHETE

Adolpho Bloch, dono da Manchete, fez uma aposta e tanto, quando decidiu entrar para o ramo da televisão, novidade para ele, cujo conglomerado de comunicação incluía revistas, sendo a Manchete a principal, e rádios por diversos locais do país.  Com estações próprias nas cidades de São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Recife e Fortaleza, além de 40 afiliadas pelo território nacional, a tevê foi ao ar em junho de 1983, segundo relata o jornalista Arnaldo Bloch em Os Irmãos Karamabloch – Ascensão e Queda de um Império Familiar, lançado em 2018 pela Companhia das Letras. A brincadeira com o título do romance Os Irmãos Karamazov, do escritor russo Fiódor Dostoiévski foi feita pelo escritor e jornalista Otto Lara Resende, que trabalhava para Bloch, ucraniano de nascença e que vivia brigando com os irmãos.

A ideia de Adolpho Bloch era fazer uma televisão para a elite, as classes A e B, já que Globo e SBT abordavam classes mais populares e a Band não tinha público definido. Arnaldo Bloch afirma que a Manchete talvez tenha sido a primeira televisão intelectualizada do país. O “Jornal da Manchete” teria chegado a influenciar até mesmo o jornalismo da Globo, acredita ele. Mas a rixa entre as duas emissoras começa quando Adolpho rompeu o trato que havia feito com o doutor Roberto Marinho, dono da rival, que não iria entrar na seara de novelas: “Agora eu quero novela”.

Com grandes nomes entre os contratados, como o jornalista Carlos Heitor Cony, lançou a primeira novela, “Dona Beija”, com texto de Walter Aguiar Filho e direção de Herval Rossano. A novela, que tinha entre os protagonistas Maitê Proença e Gracindo Jr., atingiu um certo sucesso, chegando, segundo o livro, a bater um especial de Chico e Caetano, na Globo. Manchete virava manchete em outros veículos de comunicação. Mas na mesma proporção em que o sucesso subia, as dívidas também. Bloch, porém, não dava o braço a torcer e, já no governo Sarney, quando a dívida batia nos 100 milhões de dólares, ele foi mais fundo e investiu uma grande soma em “Kananga do Japão”, com roteiro do próprio Cony, texto de Wilson Aguiar Filho e direção de Tizuka Yamasaki, como o próprio confessa em “Autores – Histórias da Teledramaturgia”.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *